foto de Spencer Tunick

quarta-feira, 7 de novembro de 2012

06.11.2012


anteontem, sonhei tua morte
sensação que continua no ainda
pesada
mantida
doída & doida
como quando tu foste
e eu sonhando
metodicamente
todos os dias de alguns meses
as noites todas
algumas manhãs também
e, agora
que falta pouco pra tua volta
regresso
me sinto mais calmo
(será que finjo tranquilidade?)
preparado para o nada
que é o que tenho
– e de como o nada é diferente da morte.

quarta-feira, 29 de agosto de 2012

Questões sócio-ambientais


Sobre como os motoristas e cobradores de ônibus vão embora para suas casas depois do expediente noturno: (1) com seus carros; (2) de táxi; (3) de bicicleta; (4) de skate;  (5) de patins; (6) a pé; (7) esperam o primeiro ônibus do dia.

sexta-feira, 24 de agosto de 2012

1ª confusão meta existencial


penso meditar sobre o não me encontrar e então não existo estou atrás de portas do lado de fora da vida de alguém dentro da alma da minha mãe e nada do que eu realmente quero eu realmente tenho porque eu sonho e escrevo que sonho para reafirmar em mim que meu erro é amar demais doar demais querer demais e viver de menos porque não vivo espero

sábado, 11 de agosto de 2012

Olho


dou vestígios de me encontrar
e então noto que te perdi
mais um pouco

sexta-feira, 20 de julho de 2012

Diário de uma noite só ou Você-eu & a distância


tudo o que cabe em linhas
tudo, que acabe em rimas

o dia de amanhã é o hoje
numa gramática bárbara

eu amo você, disse
e explodiu, morreu

era cor

se acaso estou mudo
etcétera: isto é tudo


5:35
20 de julho

quinta-feira, 12 de julho de 2012

Catulo


Nam castum esse decet pium poetam
ipsum, uersciculos nihil  necesse est

A um poeta pio convém ser casto
ele mesmo, aos seus versos não há lei.

(CATULLE. O livro de Catulo, p. 80. Tradução de João Angelo Oliva Neto. São Paulo: EdUSP, 1996)

Noturno da memória


horas se passaram desde a última vez que falei com você, várias, agora há pouco, e o que move minha tristeza-felicidade é estar bem co'a memória de você, isto é, com tudo aquilo que é esquecimento, porque a mim você me é dada como a não-imagem de futuro, é o inimaginável, é o pudor da mente, o limite: tudo aquilo que desejo por não ter.

terça-feira, 26 de junho de 2012

Noturno em hai-kai


o plexo da memória é o esquecimento
a carne da saudade é o cheiro
a roupa que me cobre é teu pelo

segunda-feira, 25 de junho de 2012

Poesia envergonhada (ou O ser & estar da tristeza)


Hoje é tempo de comer mixirica
(Ou eu quero esse tempo de volta
Por isso escrevo)

Sentar no chão da sala
Quebrar a casca laranja
E ficar um minuto arrancando a pele
De cada gomo, o caroço
Pra só depois comer
Uma mixirica (15 minutos)

(Você e o seu cheiro
Que eu não lembro
Os dois) E esta mixirica

Minha mão suja a unha
Limpo na camiseta rasgada
É o último gomo
De que forma aproveitá-lo melhor?
Ao escrever, vou tirando os fios
Brancos que embaçam o laranja de dentro
Consigo ver um caroço ali
Não sei se como de uma vez
Ou se tiro o caroço primeiro
Opto por expurgá-lo
E então já acabou a fruta

(Mas essa demora toda me angustia.)

quinta-feira, 14 de junho de 2012

Meditação sobre a distância

brega é a palavra
que a boca come
e o olho cospe
.
.
.
se a palavra lágrima não existisse
(e a lágrima só existe porque existe
a palavra) a lágrima seria o cadáver
do amor

sexta-feira, 25 de maio de 2012

prolegômenos à solidão

I
decidi deixar tu
(eu acho)

não me bastam os sonhos
essa tormenta que é acordar
toda noite
e não ter tu

não me bastam as vontades
transmutadas em tristeza
essa dor do dia
do coração frio
do estar amputado
inclusive de tu

me relaciono com tua distância
essa capacidade de não ter alguém
só tu
em minha saudade

II
teria feito tudo diferente se entendesse o que significavam aqueles carinhos, as nossas mãos, todas quatro, perdidas umas nas outras, nos (a)braços, costas, pernas, pelos, os olhos, tudo o que fica & morre no depois, porque tenho medo que tu voltes e, como costume, finjas que aconteceu nada, me lembrando, por isto mesmo, incessante, o quanto existiu

III
se me bastasse a lembrança
mas não basta e sou todo uma dor
me baste a memória e, então, te aceito, Solidão.
25.5.2012
4:35

quarta-feira, 11 de abril de 2012

Hai-kai da sodade

se esse papel me servir de beijo, te como
e escrevo na parede
pintura rupestre do amor que te sofro

sábado, 24 de março de 2012

"Vocêu"

quero escrever-te uma carta para ver-te em palavras
representação
os olhos das palavras vêem o que a imagem não fala

sinto falta do teu cheiro cheirado pelo meu nariz
da tua voz ouvida pelo meu ouvido me olvido
da tua carne vista pelos meus olhos – ou sentida

a vida é a vista da vida (ou a vida à vista)
esse mundo reino castelo de areia & sangue
bordado na tua pele

quarta-feira, 21 de março de 2012

Querida Hilda

o tempo chora o tempo
todo

(a saudade
é esse estar
sendo sem
ter sido)

sábado, 17 de março de 2012

Um textículo da tarde

o lápis feito a lápis
colapso do ápice

domingo, 4 de março de 2012

I

tu me veio recorridas
vezes à cabeça
percorrendo o plasma
do meu corpo
que, vermelho-sangue
te lamenta
[meu eu-lírico é que te lamenta!]
tu continuas em mim
como se meu corpo
te sentisse o pelo
pelos poros que suo
ao escrever, pensando em tu
estes verbos mortos
estes versos novos
que a mim me foram dados
etcétera e tal
teu nome e teu hálito.